Esse desafio não podia começar com um item fácil. Escolher uma dentre as mais de 200 músicas gravadas por eles é uma tarefa hercúlea. Mas a gente sempre dá um jeito, né? A música que eu escolhi como a preferida de todos os tempos é To Have And To Hold, do álbum Music For The Masses.
O motivo pelo qual eu a escolhi é que eu tive contato com ela pela primeira vez num momento da minha vida em que a letra fez todo o sentido do mundo. Tempos depois, sendo curiosa, eu comecei a investigar algumas coisas.
No começo da música, ouvimos um vozerio ininteligível, que se estende até o instrumental começar. Procurando bastante, achei numa Wiki dedicada ao DM a seguinte informação:
“At the beginning of "To Have and To Hold" is a Soviet news presenter saying in Russian, "В докладах рассматривается эволюция ядерных арсеналов и социально-психологические проблемы гонки вооружений" (V dokladah rassmatrivayetsya evolyutsiya yadernykh arsenalov i sotsial'no-psikhologicheskiye problemy gonki vooruzheniy) which means, "The reports consider the evolution of nuclear arsenals and the socio-psychological problems of the arms race". Alan Wilder was not aware of this when he added it to the song.”
No começo de To Have and To Hold há um apresentador de telejornal soviético dizendo em Russo: “Os relatórios consideram a evolução de arsenais nucleares e os problemas sócio-psicológicos da corrida bélica”. Alan Wilder não sabia disso quando adicionou-o [o trecho] à música.
Prestando um pouco mais de atenção a esse trecho na música, eu notei que ele não começa exatamente em V dokladah…, mas sim em sotsial'no-psikhologicheskiye, sendo repetido em loop até a entrada da bateria, quando o sampler é sobreposto por ela. Logo depois entra a voz do Dave praticamente recitando a letra composta pelo Martin:
I need to be cleansed
It's time to make amends
For all of the fun
The damage is done
And I feel diseased
I'm down on my knees
And I need forgiveness
Someone to bear witness
To the goodness within
Beneath the sin
Although I may flirt
With all kinds of dirt
To the point of disease
Now I want release
From all this decay
Take it away
And somewhere
There's someone who cares
With a heart of gold
To have and to hold
(Retirado do site depeche mode dot com)
Preciso ser purificado
É hora de compensar
Toda a diversão
O dano está feito
E eu me sinto adoecido
Estou de joelhos
E eu preciso de perdão
Alguém que seja testemunha
Da bondade intrínseca
Por baixo do pecado
Apesar de eu talvez flertar
Com todos os tipos de sujeira
Até o ponto da doença
Agora eu quero me livrar
De toda esta decadência
Jogar isto fora
E em algum lugar
Há alguém que se importa
Com um coração de ouro
Pra ter e manter
A letra é assim mesmo, uma estrofe só, marcada pela bateria cadenciada, quase em ritmo marcial. O personagem parece ter ultrapassado todos os limites possíveis, fez o que podia e o que não podia (Preciso ser purificado/É hora de compensar/Toda a diversão/O dano está feito/E eu me sinto adoecido). E agora precisa de ajuda, está pedindo por ela. A impressão que eu tenho é que esse pedido de ajuda, de socorro e perdão, vem num desespero marcado, como se a pessoa estivesse recorrendo ao seu último recurso para tentar ser alguém melhor (Estou de joelhos/E eu preciso de perdão/Alguém que seja testemunha/Da bondade intrínseca/Por baixo do pecado). E a coisa é tão séria que há a ressalva sobre si mesmo, sobre o que ainda poderá acontecer (Apesar de eu talvez flertar/Com todos os tipos de sujeira/Até o ponto da doença), porém há também a consciência de que está tudo muito errado (Agora eu quero me livrar/De toda esta decadência/Jogar isto fora). Mas este pedido de socorro não está direcionado a alguém em específico: todas as esperanças parecem perdidas, e agora só resta o apelo ao destino, ao desconhecido (E em algum lugar/Há alguém que se importa/Com um coração de ouro/Pra ter e manter).
Aliás, estes últimos versos são ambíguos: ou este alguém tem um coração de ouro e se importa com ter e manter esta pessoa desesperada, ou este alguém se importa com o coração de ouro que a outra pessoa pode vir a possuir “por baixo do pecado”, e se importará o suficiente para tomá-lo pra si e mantê-lo.
Outra coisa interessante acerca desta música é a posição em que ela se encontra no álbum: exatamente antes dela vem I want you now, que é um apelo de um homem para uma mulher para que esta se entregue a ele. Como nem tudo o que é relacionado a sexo é considerado “bonitinho” ou “politicamente correto”, To have and to hold pode até ser uma continuação daquela, mas tempos depois, quando brota um arrependimento ou remorso frente a algum ato cometido. Mas isso é mais viagem da minha cabeça do que qualquer outra coisa. Eu tenho a tendência a ver o álbum Music for the Masses como uma peça única, como se contasse uma história com começo, meio e fim. E a julgar por outras músicas, como Never let me down, eu não consigo deixar de pensar que To have and to hold é uma espécie de catarse intrínseca ao álbum.
Bem, eu acho que é isso. Digam aí nos comentários o que vocês acharam, todos os comentários serão benvindos! =)