Enjoy the Silence é a 6ª faixa do álbum Violator e o 24º single lançado na carreira do Depeche Mode. Não há vivalma que não conheça essa música.
Martin deu uma entrevista à Mojo Magazine em setembro desse ano, e falou sobre a música:
"The original demo of Enjoy the Silence was very slow and minimal, just me and a harmonium, and Alan (Wilder) had this idea of putting a beat to it. We added the choir chords and (producer) Flood and Alan said, 'Why don't you play some guitar over the top?' That's when I came up with the riff. I think that's the only time in our history when we all looked at each other and said, 'I think this might be a hit.'"
A demo original de Enjoy the Silence era bastante lenta e minimalista, apenas eu e um arranjo, e Alan (Wilder) teve a ideia de adicionar uma batida a ela. Adicionamos os acordes do refrão e (o produtor) Flood e Alan disseram, 'Por que você não toca um pouco de guitarra por cima?'. Foi quando eu fiz o riff. Eu acho que essa foi a única vez em nossa história em que olhamos uns pros outros e dissemos, 'Acho que isso pode ser um hit.'
O clipe da música, dirigido por Anton Corbijn, foi filmado na Europa, em diferentes localidades, e mostra Dave Gahan andando por entre belíssimas paisagens, vestido como um rei (coroado e envolto num manto) e carregando consigo apenas uma cadeira dobrável. Entre uma paisagem e outra, ele se senta na cadeira e canta o refrão da música. Por fim, ele para num lugar nevado e fica a admirar o cenário. Intercalado com as cenas de paisagens há pequenos spots em preto e branco mostrando os demais integrantes da banda.
Essa solidão que o vocalista mantém durante o clipe dialoga diretamente com a letra da música:
Words like violence
Break the silence
Come crashing in
Into my little world
Painful to me
Pierce right through me
Can't you understand
Oh my little girl
All I ever wanted
All I ever needed
Is here in my arms
Words are very unnecessary
They can only do harm
Vows are spoken
To be broken
Feelings are intense
Words are trivial
Pleasures remain
So does the pain
Words are meaningless
And forgettable
All I ever wanted
All I ever needed
Is here in my arms
Words are very unnecessary
They can only do harm
(Retirado do site depeche mode dot com)
Palavras violentas
Quebram o silêncio
Vêm destruindo
Dentro do meu mundinho
Doloroso pra mim
Perfura-me diretamente
Você não pode entender
Minha pequena
Tudo o que eu sempre quis
Tudo o que eu sempre precisei
Está aqui em meus braços
Palavras são totalmente desnecessárias
Elas podem apenas ferir
Promessas são feitas
Para serem quebradas
Os sentimentos são intensos
As palavras são triviais
O prazer permanece
Assim como a dor
Palavras não têm sentido
E são esquecíveis
Tudo o que eu sempre quis
Tudo o que eu sempre precisei
Está aqui em meus braços
Palavras são totalmente desnecessárias
Elas podem apenas ferir
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A primeira coisa que chama a atenção no clipe é a alternância dos integrantes da banda. O primeiro spot mostra Andy, Dave, Martin e Alan; num piscar da rosa da capa do Violator, permanecem Andy, Dave e Martin; outra rosa, e ficam apenas Dave e Martin; por fim, mais uma rosa, e Dave está sozinho. Isso acontece durante a introdução da música. Quando o riff da guitarra começa, Dave já está em sua jornada, caminhando por um vale. Ele anda sozinho, e no refrão ele se senta pra cantar, apreciando a paisagem. No interlúdio entre o final do refrão e o começo do riff, os demais integrantes aparecem com ele. Isso acontece durante todo o clipe. Enquanto está numa praia, Dave não se senta enquanto canta o refrão, mas apenas depois, quando acomoda-se na areia e deixa que a água passe por ele. No fim do clipe, ele se "estabelece" numa área cheia de neve, e a música termina com ele sentado, parecendo distraído, e a frase "enjoy the silence" ecoa.
Essa alternância entre a imagem dos integrantes da banda enquanto a música é apenas instrumental e a solidão de Dave enquanto a letra é cantada é bastante sugestiva. Ele está apreciando o silêncio; como diz a letra, "palavras são totalmente desnecessárias/elas podem apenas ferir". E por mais que o silêncio possa ser apreciado na companhia de outras pessoas, a solidão é perfeitamente aceitável para isso. Embora ele esteja sozinho, a letra refere-se a uma "pequena" (little girl), que provavelmente é o objeto de desejo do eu-lírico. E mesmo sem a presença dela, esse silêncio que ele aprecia em meio às belas paisagens parece conter tudo o que ela representa para ele.
A letra da música vai descrevendo todos os sentimentos sobre as palavras. Elas são violentas, quebram o silêncio, machucam. Elas são usadas para fazer promessas que se quebram, são triviais, não têm sentido, e são facilmente esquecidas. Mesmo que os pensamentos sejam formados por meio de palavras em nossa mente, elas não são necessariamente palavras, pois os conceitos semânticos por trás delas é que se juntam, e não a forma gráfica ou fonética delas. Tais formas só aparecem no momento da expressão, e às vezes isso pode se dar de forma desastrosa. O léxico de um idioma, por maior que seja, é limitado, e dificilmente conseguirá expressar a totalidade dos sentimentos que existem dentro de alguém. Isso é demonstrado nos versos "os sentimentos são intensos/as palavras são triviais". Por essa razão, o silêncio é necessário, pois não há palavras no silêncio. Há os sentimentos, os pensamentos, mas não as palavras. Por vezes o silêncio é a pura expressão de um sentimento; basta pensarmos nas vezes em que ouvimos alguma coisa e ficamos sem fala, sem conseguir expressar em palavras o que estamos sentindo.
O "mundinho" que é destruído com as palavras que quebram o silêncio é nosso mundo interior, aquele que contém todos os nossos sentimentos, todas as nossas experiências, tudo o que nos forma como pessoas. É o mundo que grita por dentro, mas muitas vezes cala-se por não necessitar de uma expressão para fora. É onde "o prazer permanece/assim como a dor". E por cada mundo ser diferente um do outro, não é possível saber o que vai leva-lo a se despedaçar. Sendo um pouco radical, o entendimento do que se passa dentro deste mundo é tão obscuro que até uma frase bonita como "eu te amo" pode fazer com que alguma coisa seja perfurada, pra usar uma expressão da letra da música. Apenas quem habita esse mundo sabe qual é o limite, e é por isso que as palavras acabam virando uma faca de dois gumes: elas tanto podem fazer bem quanto podem fazer mal.
O fato do Dave parar num campo nevado ao final da música, com a frase "aprecie o silêncio" ecoando, sugere que ali ele está em paz, pois a neve é branca, e o branco é reconhecido como a cor da paz. Em meio a esta paisagem inóspita, porém acolhedora, o eu-lírico sente a paz do silêncio, e está confortável com isso, já que aparenta estar distraído, em meio ao silêncio e à visão da paisagem. Ali não há violência, não há destruição, não há dor, não há promessas. Não há palavras. Há apenas a paz, e o silêncio…